“A Vida Secreta de Walter Mitty”, dirigido e protagonizado por Ben Stiller (“Uma Noite no Museu”), é um ótimo filme para assistir quando em geral somos tomados por vários planos que desejamos realizar.
A película aborda a vida de Walter Mitty, o responsável pela seção de arquivo e revelação de negativos da revista Life, que vive sonhando acordado com aventuras mirabolantes.
Ao contrário de seus sonhos, ele teme até enviar uma piscadinha para uma pretendente via um site de relacionamentos.
A história, que na realidade pode soar como auto-ajuda (mas e daí?), acompanha a trajetória desse personagem dividido entre sonhos extravagantes e uma realidade acachapante. Quem aí não se identifica com isso?
Por isso o filme é ainda mais tocante, na medida em que encontra ecos na realidade de muitos de nós.
A Vida em Negativo: A Vida Secreta de Walter Mitty
Ben Stiller traz personagem que vive sonhando acordado com uma grande aventura
Ben Stiller no seu ambiente de trabalho na revista Life, em cena de “A Vida Secreta de Walter Mitty” |
No filme “A Vida Secreta de Walter Mitty” (The Secret Life of Walter Mitty, 2013), Stiller vive esse profissional que tem momentos em que simplesmente se desliga da realidade e começa a sonhar acordado.
Os sonhos, na verdade, encontram paralelo em planos do passado, que ele abandonou desde a morte do pai, para se dedicar a um emprego por mais de uma década.
Mesmo para quem não tem um emprego tão ruim (que é o caso de Mitty, que gosta e executa bem o seu serviço), ou vive uma vida com algumas realizações mas ainda assim ordinária, tudo o que sonhamos parece ser sempre maior do que somos realmente.
Entre fotos e viagens
Mitty apresenta um bom trabalho na revista Life, e tem uma parceria interessante com o renomado fotógrafo Sean O’Connel (vivido por Sean Penn, de “Milk” e diretor de “Na Natureza Selvagem”), que é um dos últimos profissionais que ainda trabalha com fotografia analógica.
Sean enxerga nele a continuidade de seu trabalho, já que Mitty é responsável por revelar seus negativos. Por isso Mitty recebe do fotógrafo uma carteira de presente, em sinal de sua gratidão por essa longa parceria.
Junto com a carteira, envia também alguns negativos, entre eles uma das fotos seria muito significativa e a capa da próxima edição da revista Life. Só que Mitty não encontra o negativo.
ATENÇÃO: A partir daqui, o texto contém SPOILERS.
Walter Mitty em uma das paisagens da Islândia retratadas no filme |
Forçado a sair à caça de uma fotografia tão importante (a foto de capa da próxima edição da revista Life), Mitty parte numa viagem no encalço de Sean, em que irá passar pela Groenlândia, Islândia e até no Afeganistão, vivendo incríveis aventuras. Estaria ele ainda sonhando acordado? Será que somos o que somos ou somos o que sonhamos?
Entre o sonho e a realidade
Assim como Walter Mitty, quando comecei a escrever nesse blog, parece que criei um personagem que se deslocou um pouco de quem eu sou. O Fábio Pastorello do Viagens Cinematográficas é muito mais interessante do que o Fábio da vida real. Talvez o blog tenha se tornado minha forma de sonhar acordado.
Por isso, uma das cenas do filme me pareceu ainda mais significativa. Walter Mitty percorre várias regiões do mundo e vive fantásticos momentos durante suas viagens, até que finalmente consegue encontrar Sean para questioná-lo do negativo faltante.
Sean está numa montanha, prestes a fotografar um momento único (a aparição de um belo tigre, que é super difícil de ser visto). Afinal o misterioso e aguardado tigre aparece, mas Sean não registra a foto.
Questionado por Mitty, Sean afirma que certos momentos precisam ser admirados sem a distração do registro fotográfico. De fato, o registro fotográfico às vezes pode ser tão preponderante sobre a realidade vivida, que pode até modificá-la para sempre, de tal forma que o que se lembrará será somente a representação (a fotografia) e não a realidade (o momento vivido).
O encontro entre Walter Mitty e Sean O’Connel, revelador de negativos e fotógrafo aventureiro |
Uma realidade inventada?
Assim como Walter Mitty, eu vivo nessa zona nebulosa entre sonho e realidade, entre a representação e os fatos, entre o que eu sou e o que eu desejo ser. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra.
O sonho é importante, mas pode me privar da vivência de momentos autênticos e reais. Meu exercício constante deve ser manter esse pé no sonho, e outro pé na realidade, e tornar minha vida tão cativante quanto meus sonhos.
No filme, o personagem encontra finalmente seu lado aventureiro que até então encontrava-se perdido no passado (mas de fato suas aventuras podem conter uma boa dose de invenção, tendência que se encontra em outra produção do mesmo ano, o bonito “As Aventuras de Pi”). O importante é que a “realização” do sonho deixa Mitty mais forte, traz ensinamentos e motivação para enfrentar seus problemas e correr atrás de seus objetivos. A viagem no encalço do negativo e de Sean O’Connel é modificadora e transforma sua vida, de um modo nada inventado.
Porque a vida não é nada, sem sonho. Como em William Shakespeare, “sabemos o que somos, mas não o que podemos ser” ou ainda “somos feitos da mesma matéria que nossos sonhos”. O sonho é o que nos fortalece para a vida real.
Além de todas essas reflexões, o filme de Ben Stiller possui locações em Nova Iorque, na Islândia, entre outros lugares pelo mundo, interpretação inspirada de Stiller (em personagem cativante) e elenco interessante, que conta com Sean Penn, Shirley McLaine e Kristen Wigg (“Missão Madrinha de Casamento”, que faz o interesse romântico).
O filme ainda traz uma interessante inserção de mensagens que são colocadas em determinados momentos da história, ilustrando as cenas ou trazendo mensagens que colaboram para a construção das ideias do filme. Uma produção envolvente, que pode despertar o aventureiro que existe dentro de você ou pelo menos mostrar que viver seus sonhos, é de fato viver sua vida real.
FICHA TÉCNICA:
Produção: 20th Century Fox e Samuel Goldwyn Films
Fotografia: Stuart Dryburgh
2 Comentários
Muito obrigado. Pois é, Fran. Já é uma delícia viajar, agora fazer essas "viagens" via blog são ainda mais deliciosas. O problema é que vicia. hehehe… Abs.
Ótimo post, Fabio. Gostei da parte que vc fala do Fabio do blog ser mais interessante do Fabio da vida real. No meu caso, criei o Viagem de Cinema para estar sempre em contato com os meus sonhos e nunca esquecer de colocá-los em prática. Vamos combinar: é uma delícia, escrever neles e realizar estas viagens fantásticas!